domingo, 8 de fevereiro de 2015

sem poesia

Saiu da terapia exultante. Desceu a Avenida da Zona Sul com um andar seguro. Agora já era. Depois  de longos meses. Marcados no calendário. Uma semana dormindo nor-mal-men-te. Sem pensar neles. Nele. Nela. Isso significava muito. Muito.
Aliviada resolveu sentar-se e tomar café na padaria fina, que custava os olhos da cara.( A vida dos ricos é boa.) Sorveu o expresso com gosto, pensou em como seria dali pra frente, anotou coisas numa caderneta. "Hoje dia 7 de fevereiro encerro mais um ciclo. Uma vida nova me espera e estou ansiosa por vivê-la. Que venha." (Era um pouco dramática, vício de profissão.) 
Depois quis ir de táxi, loucura completa. Ia gastar muito. Uns 50 contos, morava longe. Mas hoje seria mais que justo. No caminho tudo parecia mais intenso e alegre. (Ah! A vida dos que tem carro é mais cômoda.) Chegou logo em casa. Decretou  dia de folga.  Não faria mais nada. Só ia curtir o momento. Quase comemorar. Abriu um vinho branco e até cantarolou Amy, arriscando uns passos na sala, rindo alto. A louca sou eu. You now, I'm no good.  

Então: 
1) abriu a coluna social diária.
2) deu de cara com uma foto de um casal sorridente, vernissage de um livro. 
3) sem respirar leu a dedicatória "para o amor de fulana". 
4) nos comentários estava escrito "o casal do ano", "lindos", "amo vocês".                            

(Eu bem que te avisei, sua idiota! Pra fazer parte disso tem que ter estômago.)

Correu pro banheiro.  Vômito e lágrimas. Por mais que se esforçasse entender aquilo era demais pra ela. Sete meses de luto jogados no lixo. Entrou no chuveiro e tomando um banho  repetia: para o amor de fulana, para o amor de, para o amor.... para,  pá! Tonteou. Seria a labirintite? Escorreu pelos azulejos brancos (davam tanto trabalho para limpar, ainda pensou). Tudo escuro, olhos cerrados. E a água, mansa e morna, escorrendo pelos seus quadris. 

Foi encontrada um dia depois pela Carla, moça que, às vezes, ajudava na faxina. Ainda respirava.